O tal do “nome sujo”

Em um cenário ideal o mundo funcionaria mais ou menos assim: a gente trabalharia, receberíamos os salários ou pró-labores e este dinheiro seria suficiente para suprir todas as nossas necessidades e vontade do hoje e do amanhã.

Mas… sejamos honestos, não é bem assim que as coisas acontecem.

Dificilmente estamos plenamente satisfeitos com a condição atual. É bastante normal querer comprar algo e não ter o dinheiro disponível. E isso acaba nos levando a vez ou outra errar a mão e gastar mais do que se poderia. E quando isso acontece muitas vezes é possível que as dívidas assumam uma proporção maior e se acabe com o “nome sujo”.

Neste texto pretendo falar um pouquinho sobre essa condição para além do preconceito que já existe sobre o tema.

Então o que significa termo “nome sujo”?

Este termo é a maneira popular de falar da situação da pessoa que, por ter ficado inadimplente, teve suas dívidas inseridas em alguma lista das organizações de proteção ao crédito tais como o SERASA, SPC ou SCPC.

Essas organizações são bancos de dados privados que fornecem informações sobre crédito a quem contratar os seus serviços. Ou seja, se você vai tomar um empréstimo de alguma instituição é provável que ela faça uma consulta em alguma destas organizações para verificar se você está inadimplente com alguém. Com essa e outras informações a instituição pode decidir se vai te emprestar aquele dinheiro ou não.

E qual é a principal consequência?

A consequência mais chamativa é a restrição ao crédito. Isso significa que ficará mais difícil conseguir novos empréstimos. Mas existem maneiras e maneiras de encarar este dano e gosto muito da abordagem que o Ben Zrue trouxe em seu livro “Eu vou te ensinar a ser rico”.

Ele sugere a reformulação do termo de “nome sujo” para “nome protegido”. Segundo ele, a restrição de crédito para algumas pessoas pode ser o começo de uma nova fase, pois protege a pessoa evitando que ela tome novos empréstimos e deixe o problema ainda maior. E falando por minha experiência como planejadora financeira digo que concordo em gênero, número e grau.

Mas atenção!

É de se esperar que o credor recorra à Justiça para executar esta dívida. Mas para proteger o devedor de abusos, vale consultar o Artigo 833 do Código Civil que dispõe sobre quais são os bens impenhoráveis e que não estão sujeitos à execução, tais como: quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários-mínimos; vestuário; livros; seguro de vida; o imóvel em que se mora (a não ser que esteja na garantia da dívida), entre outros.

E não deixe de levar em conta as características específicas da sua dívida. É importante estudar quais são as garantias envolvidas e regras em seu caso. Para se informar, busque ler e entender o contrato da sua dívida, e se isso parecer difícil, busque o auxílio de um profissional.

Mas então ter o nome sujo pode ser uma coisa boa?

Em alguns casos pode ser encarado como uma oportunidade de recomeçar.

O acesso ao crédito nos deixa mais permissivos em relação ao consumo. Esse assunto já foi vastamente estudado por uma série de pesquisadores, e um dos artigos que eu mais gosto é o Always Leave Home Without It: A Further Investigation of the Credit-Card Effect on Willingness to Pay de Prelec e Simester publicado em 2001. A conclusão deste estudo indica que as pessoas ficam mais dispostas a gastar quando não precisam se desfazer do dinheiro no mesmo momento, o que é muito facilitado por meio do uso do cartão de crédito; um verdadeiro perigo!

E aqui aproveito para fazer um gancho: o fato de estar com o nome negativado não faz você perder o direito de usufruir os serviços anteriormente contratados, tais como outros empréstimos ou o próprio cartão de crédito. Mas especialmente quando falamos de cartão de crédito, é importante ficar atento a maneira como este é usado, pois pode ser uma ferramenta que ajuda ou que atrapalha muito. Depende da maneira como se usa.

E quando a alternativa de tomar novos empréstimos é eliminada, não há outro jeito se não repensar os gastos que estão sendo feitos e fazer os ajustes necessários. E é bem aí que acontece o pulo do gato.

O começo de uma nova fase

Em muitos casos, só quando o nome já está negativado é que as pessoas se propõe a encarar os números. Neste texto a Keylla falou um pouquinho sobre a importância de se começar o processo de colocar a casa em ordem, ainda que em um primeiro momento pareça que nada tem jeito.

Por vezes, o movimento de reorganização demanda tempo, paciência, estratégia e conhecimento.

Nesta fase, é importantíssimo colocar os números no papel, levantar os valores das dívidas, entender quais são os juros cobrados, entender quanto você consegue poupar de tempos em tempos, levantar fatores variáveis (como receitas extras ou saídas extras) e se necessário, pedir ajuda.

É uma fase turbulenta, já acompanhei alguns clientes da consultoria financeira que passaram por isso. E o que eu posso dizer com segurança é que quando existe um plano, uma estratégia, um prazo, é possível ter mais calma para encarar esta fase tão complicada.

Por aqui sabemos que, por mais que os números importem, não se trata somente deles. Uma redução dos gastos significa repensar hábitos que fazem parte do cotidiano. Mas volto a bater na tecla de que quando existe um porquê e uma estratégia pensada esse processo faz sentido e pode te ajudar a reduzir as noites mal dormidas.

E como fazer para limpar o nome?

É amplamente divulgado que, depois de cinco anos com o CPF negativado a dívida some, mas não é bem assim.

De fato, depois de 5 anos a dívida deve ser excluída das listas dos órgãos de proteção ao crédito e o nome volta a ficar limpo, mas a dívida continua existindo e o credor continua tendo o direito de cobrar por ela.

Por isso, a melhor maneira de limpar o nome é pagar o que se deve.

E vale lembrar que, devido a este prazo, muitas empresas e instituições financeiras se propõe a negociar os valores das dívidas com o passar do tempo.

E por fim …

Sei que este assunto não é fácil. Sei que para muita gente ter o nome sujo é algo que traz sentimentos e sensações extremamente desconfortáveis. O que eu quis te trazer por aqui é que não é o fim do mundo.

Muita gente já passou por isso. Muita gente já se recuperou. E tá tudo bem.

Somos humanos e vez ou outra é natural metermos os pés pelas mãos. Mas com calma, paciência e estratégia dá-se um jeito. 

Lorena Pires

Consultora Financeira Pessoal da Papo de Valor. Acredita que por mais “exata” que seja a matemática, nem tudo são números. Atuar ajudando pessoas a se organizar financeiramente – e consequentemente colaborar para que tenham uma vida mais livre – é seu principal propósito.

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